Angelina Jolie concede entrevista para a revista Vanity Fair Italiana

COMO PODEMOS AJUDAR OS OUTROS?

Por: GINEVRA LAMBERTI, Foto: LACHLAN BAILEY 

Desde tomar uma posição pelo Afeganistão até o programa Mulheres pelas Abelhas em apoio às apicultoras, campanhas humanitárias e proteção da biodiversidade: "Eu ainda sou a jovem punk que costumava ser", disse Angelina Jolie, "mas uma vida não vale a pena ser vivida, se não for útil aos outros".

Estamos na Provença, numa clareira na floresta, há muitas de nós, quase todas mulheres. Existem diferentes idades, histórias, origens geográficas, idiomas, aparência, roupas. O objetivo é o mesmo: ouvir e falar sobre a proteção do planeta através da proteção e estudo das abelhas. Somos jornalistas, escritores, profissionais de relações públicas e apicultores. Estamos em um semicírculo e ouvimos as palavras de Noëline Raondry Rakotoarisoa, representante da Unesco, Véronique Courtois, CEO da Guerlain, Thierry Dufresne, fundador do Observatório Francês de Apidologia, e Angelina Jolie, madrinha do programa Women for Bees (Mulheres pelas Abelhas). Este é um programa nascido da parceria entre Guerlain, Unesco e Ofa e tem como objetivo treinar mulheres, para se profissionalizarem nas praticas da apicultura. O curso, que contou com a participação de sete jovens mulheres, terminou em Aix-en-Provence com a entrega oficial de diplomas na presença de Angelina Jolie, que está envolvida em campanhas humanitárias há vinte anos (a crise no Afeganistão a levou a abrir um perfil Instagram em 20 de agosto para apoiar a causa da população local, rompendo sua rigorosa distância das redes sociais) e a proteção da biodiversidade. Este não é um programa de curto prazo, diz Véronique Courtois, mas "uma responsabilidade que é uma forma de retribuir a natureza". O Women for Bees vai ser realizado durante cinco anos, com o objetivo de treinar cinquenta mulheres apicultoras de todo o mundo e dar-lhes as ferramentas para se tornarem empreendedoras independentes, no contexto de uma rede internacional que promove os valores da biodiversidade e do empoderamento feminino. Até 2025, as novas profissionais terão contribuído para a instalação de 2.500 colmeias nas Reservas da Biosfera da UNESCO e para o repovoamento de 125 milhões de abelhas.


VF: Como começou a experiência como embaixador das abelhas?

Angelina Jolie: Eu estava no Camboja com Guerlain para a gravação do comercial do perfume (o que é bastante engraçado porque você não pode realmente usar perfume na selva a menos que queira correr o risco de contrair dengue ou malária). Nessa área já tínhamos muitos projetos em andamento, envolvendo escola e apicultura. Então começamos a conversar sobre isso e nos perguntar o que mais poderíamos fazer. Foi assim que, em parte, o programa nasceu.

Falando de seu último filme, Those Who Want Me Dead, você disse que quando você está quebrada, é importante se dedicar a algo significativo. Você acha que seu papel de ativista tem influência em seu papel de atriz, e vice-versa?

Primeiro de tudo sou mãe, segundo sou uma ativista humanitária; só em terceiro sou atriz. Mas acho que em alguns dos papéis que desempenhei e filmes que dirigi, você pode encontrar temas próximos às minhas crenças sobre o que uma mulher precisa. Eu acho que as mulheres são muito fortes, mas dentro deste mundo, elas também são muito vulneráveis. Quando digo "quebrada" - e certamente já estive - penso nas mulheres de todo o mundo que quero ajudar a se fortalecerem, serem autônomas e conectadas com seus círculos sociais. Não se trata apenas de se sentirem forte, trata-se de se sentirem seguras. Estes são temas que certamente se interligam muito em meus trabalhos.

Vivemos em uma época em que ser egocêntrico é bastante comum; por outro lado, você disse que uma das perguntas mais importantes a se fazer é: Qual é minha contribuição para os outros?

Eu acho que não vale a pena viver uma vida, se ela não for útil para outra pessoa. Isso provavelmente acontece porque eu experimentei a única e mais autêntica felicidade em dar minha contribuição, seja criando meus filhos, entrando em contato com pessoas de diferentes partes do mundo ou fazendo algo para preservar, em vez de destruir, o ambiente em que vivo. Estou longe de ser perfeita, na verdade ainda sou a jovem punk que costumava ser, mas sim, acredito que se um ser humano não sentir que tem um propósito, isso vai acabar destruindo sua alma.

Há dezoito anos, sua fundação MJP foi criada para aliviar a pobreza extrema, proteger o meio ambiente e preservar a vida selvagem no noroeste do Camboja. Combinando a luta contra a pobreza e a luta para proteger o meio ambiente, você percebeu que tudo faz parte do mesmo sistema. Por que as instituições nem sempre entenderam que diferentes questões críticas estão inextricavelmente ligadas?

Vou responder que aqueles que nos governam sabem. Eu acho que eles simulam a ignorância, eles simulam não entender como tudo está conectado. Se olharmos a situação de perto, veremos que existe uma clara intenção de esmagar as pessoas, de roubar recursos, de tirar mais do que damos. Portanto, não é verdade que eles não estejam cientes da destruição do meio ambiente, das populações locais e da economia dos países, eles estão extremamente conscientes disso. Eles estão escolhendo exercer o controle e saquear em vez de construir e ver todos como iguais, como seres humanos extraordinários no qual podem investir.

A emergência sobre as mudanças climáticas foi trazida à atenção do mundo pelo movimento das sextas-feiras para o futuro, cujo a líder é Greta Thunberg, então uma criança, agora uma jovem mulher. Qual é sua visão do futuro, especialmente para os jovens?

Como a maioria dos pais, estou muito preocupado com o estado do mundo em que vivemos, mas, por outro lado, os jovens também são uma grande fonte de inspiração para mim e tenho muita esperança. É necessário ter esperança para imaginar uma saída. Eu admiro muito Greta e temos estado em contato para meu próximo livro. Escrevi sobre a importância de ajudar os mais jovens a entender que dar-lhes uma educação, um ambiente limpo, a oportunidade de brincar em vez de trabalhar o dia todo não são presentes, são seus direitos. Devemos mudar radicalmente a maneira como olhamos para qualquer pessoa vulnerável em nossa sociedade. Não se trata do que decidimos dar-lhes, mas sim de compreender o que lhes tiramos. Toda nossa energia deve ser gasta para empurrar os pequenos para a frente e ouvir o que eles têm a dizer. Devemos ajudá-los a estar prontos para enfrentar o futuro.

Quando você falou abertamente sobre suas cirurgias preventivas, foi inspirador para muitas pessoas, mas também muitas reagiram com perplexidade e medo. É possível que, para aprendermos a respeitar e cuidar do planeta, tenhamos primeiro que aprender a respeitar e cuidar de nosso próprio corpo?

No budismo, o conceito de estar presente no momento é muito central. Acho que quando estamos realmente alinhados, também somos parte do meio ambiente, e então podemos sentir que somos parte da terra, sentir nossos pés descalços, e que não somos uma coisa separada de outros seres vivos. Isto pode nos ajudar a nos respeitar e, como todo mundo, eu também estou dentro deste processo. Não me levanto de manhã fazendo yoga, não sigo a dieta perfeita e não sei como manter a calma. Cada um de nós tem essa ideia de como deveria ser, como deveríamos ser, mas é difícil. Recentemente conheci um monge e estava conversando com ele sobre muitas coisas, mas ele me parou e perguntou: "Como você está agora? Exatamente neste momento"... Minha mente viaja para todas as razões pelas quais as coisas não estão indo bem, mas ele me convidou para estar em cada momento. Isto está me ajudando muito porque às vezes uma mente agitada tende a correr muito à frente. Portanto, trata-se de sentir mais, e eu acho que pode ser importante para as mulheres em geral se sentirem mais seguras e abertas.

Você acha que para obter certos resultados, mesmo profissionalmente, é exigido que as mulheres tenham um padrão particular de perfeição e autocontrole?

Eu não sei especificamente, mas as mulheres certamente estão sob muita pressão. Acho que esta pressão é diferente, dependendo da sociedade, do país, da família, da religião. Qualquer que seja o lugar e a situação em que se encontrem, isso muda, mas certamente há muitas expectativas. Acho que as mulheres podem fazer muito umas pelas outras, para ajudar e cuidar umas das outras, e espero que parte do projeto Mulheres pelas Abelhas também nos aproxime. Como mulheres, temos uma conexão muito especial. Também acredito, e nunca é demais frisar isto, que o mais importante para uma mulher é sentir-se segura. Muitas vezes estamos tão concentrados nas expectativas, padrões e beleza, mas o cerne da questão, de porque uma mulher muitas vezes não pode ser completamente ela mesma, é que ela não se sente suficientemente segura. Isso acontece porque ela sente que seu comportamento pode prejudicá-la de alguma forma, seja por ser abusada fisicamente, ou ao perder seu emprego, sendo ameaçada por uma parte de sua comunidade, condenada ao ostracismo ou isolada enquanto tentava criar seus filhos. São estas coisas que calculamos o tempo todo como mulheres, tem muito mais a ver com a sobrevivência do que com a opinião das pessoas sobre modelos de beleza. Não é com isso que uma mulher está realmente preocupada, uma mulher está preocupada com a sobrevivência.