Angelina Jolie concede entrevista para a revista Backstage

Por: Vinnie Mancuso

Como a artista multifacetada encontrou uma verdade mais profunda ao confiar em seus instintos em vez das expectativas.

Não faz muito tempo, Angelina Jolie estava em um estúdio de tatuagem. O zumbido das agulhas a fez lembrar do início de sua carreira, quando ouviu inúmeras advertências de que ter a pele tatuada, limitaria suas oportunidades como atriz.

"Se você for trabalhar, vão ter que cobrir, e você está assumindo um compromisso", ela relembra. Ela se destacou como a cyberpunk Acid Burn no thriller "Hackers", de Iain Softley, em 1995. "Mas também, há algo sobre ser ator que muitas vezes se espera que você se torne uma tela em branco para os personagens. Você quase tem que se manter um ser indefinido para poder se transformar em coisas diferentes."

Mas Jolie, que nunca foi de dar ouvidos a avisos, viu isso de maneira diferente. Para ela, as tatuagens sempre foram algo pessoal — vitais, até — para sua vida como artista. "Foi uma das muitas coisas que fiz na minha vida que eram separadas do cinema ou estar na frente das câmeras — que era eu e não um personagem", ela diz. "Então, eu não estava apenas sendo uma tela em branco, mesmo literalmente."

"Ter uma identidade própria é muito importante quando grande parte do seu trabalho é se transformar em outras pessoas", ela continua.

Mais de vinte tatuagens, duas indicações ao Oscar de melhor atriz (e uma vitória, por "Garota Interrompida", de 1999) e quase 6 bilhões de dólares em bilheteria depois, essa distinção entre o pessoal e o profissional continua tão importante quanto nunca. Isso é especialmente verdadeiro agora, enquanto ela embarca em uma turnê de retorno para seu papel principal em "Maria", de Pablo Larraín, no qual interpreta a cantora de ópera Maria Callas, uma figura que mudou a cultura no final de sua vida.

O drama da Netflix rendeu a Jolie uma ovação de pé de oito minutos no Festival de Cinema de Veneza, além de indicações ao Globo de Ouro e ao Critics' Choice, e marca o seu primeiro grande papel em três anos. "Maria" é o primeiro projeto desde o drama "A Troca", de Clint Eastwood, em 2008, que a coloca sob os holofotes de uma temporada de prêmios. (Em dezembro, ela fez sua primeira aparição em um programa noturno em uma década no "The Tonight Show Starring Jimmy Fallon").

"Estou entrando e saindo disso", diz ela, sorrindo, referindo-se à recente enxurrada de aparições no tapete vermelho e entrevistas. "Sempre abordei isso dessa maneira. Você só participa de alguns eventos, depois vai para casa e não permite que isso se torne o centro da sua vida. É preciso se concentrar na arte. É muito importante não levar tudo muito a sério e deixar que isso consuma seus dias ou seu trabalho."

Para Jolie, o trabalho é o aspecto mais pessoal de todos. Ela se desculpa, de forma encantadora, várias vezes ao longo da nossa conversa por não encontrar as palavras certas para descrever o que faz antes e depois do diretor dizer "ação". É instintivo; não é planejado. Embora tenha uma formação formal no Método de Lee Strasberg, que recorre à memória sensorial para criar performances vividas, Jolie prefere uma abordagem mais indefinível. 

"Para mim, atuar não é tanto uma questão de adquirir uma habilidade para trabalhar, mas sim de se tornar uma pessoa mais sensível e em sintonia, estudando o comportamento humano e trabalhando em comunidade com outras pessoas criativas", explica ela. "Essa vida criativa vem da vida real, não tanto de uma aula."

Jolie frequentemente retorna a essa ideia: "a vida criativa". Para ela, o que atrai você como pessoa, molda quem você se torna na tela. "Muitos artistas são pessoas emocionalmente sensíveis que sentem a necessidade de se comunicar com os outros", diz ela. "Eles sentem a necessidade de fazer perguntas sobre a vida, a morte, o luto ou a loucura. Eles querem entender algo sobre a vida, sobre si mesmos ou sobre outras pessoas. Muitas vezes, essa jornada é mais turbulenta do que se pode quantificar. Atuar, eu acho, é sobre permanecer um pouco cru como pessoa e ser capaz de deixar essas coisas fluírem através de você."

É por isso que "Maria" representou um desafio tão grande — e o motivo pelo qual sua performance é tão notável. "Mais do que qualquer papel que já fiz, este exigiu equilibrar o técnico e o emocional", diz Jolie. 

No auge de sua fama nas décadas de 1940 e 1950, Callas foi uma força da natureza no mundo da ópera. Ela era uma soprano maior que a vida, que quase sozinha revitalizou o interesse do público pelo estilo clássico bel canto, através do puro poder de sua voz e presença de palco.

No entanto, perseguida pela imprensa por seu temperamento volátil e por acusações de declínio vocal a partir do final dos anos 1950, a antiga prima donna passou seus últimos dias em grande parte sozinha. Jolie se identificava com a ideia de uma mulher imensamente talentosa que era gradualmente desgastada pela implacável atenção da mídia. No entanto, ela absolutamente não se identificava com o fato de ser uma cantora de ópera de classe mundial.

Para chegar a esse ponto, Jolie passou sete meses treinando com o renomado treinador vocal Eric Vetro, o gênio musical que também trabalhou com Timothée Chalamet em A Complete Unknown e Ariana Grande em Wicked. "Na minha primeira aula de canto, eu simplesmente comecei a chorar", relembra Jolie. "Eric disse: 'Respire fundo, relaxe e deixe sair um som pleno.'"

Ela logo descobriu que a linha entre o técnico e o emocional não era tão ampla quanto pensava: "As emoções vieram à tona porque acho que todos nós guardamos muitas coisas em nosso interior, em diversos lugares", diz ela. "Eu comecei a cantar, e tudo era novo para mim. Fiquei chocada ao descobrir que eu sou uma soprano. Quando atingi uma nota alta pela primeira vez, fiquei atônita, apenas olhando para o treinador." 

Jolie não estava aprendendo apenas com Vetro, mas também com a própria Callas. A cantora deixou centenas de gravações — performances completas, árias, e até uma série de aulas magnas que ela conduziu na Juilliard entre 1971 e 1972. Em dezenas de sessões de audição solitárias no escuro, Callas ensinou a Jolie como ser Callas.

"Isso exigiu algo com o qual eu não tinha nenhuma familiaridade", diz a atriz. "E descobri que não poderia ter feito isso se não tivesse seguido o conselho de Callas de aprender o básico, o italiano e a música. Não pense sobre isso emocionalmente ou o personalize; apenas execute o trabalho técnico com tanta precisão que, quando chegar a hora, você possa fazer essa parte sem pensar." 

"Maria" foi a introdução de Jolie à interpretação de uma colega artista, uma experiência que a levou a explorar seus sentimentos sobre seu próprio ofício e tudo o que isso envolve. "O filme em si é o estudo de uma artista, de alguém que viveu e realmente lutou muito como artista", diz Jolie. "Ela era uma grande artista, mas não era amada por quem ela era fora do palco e morreu se sentindo muito atacada e muito sozinha. Ela fez algo excepcional, mas o processo de fazê-lo nem sempre foi prazeroso." 

Durante as filmagens de "Maria", a atriz vivenciou uma série de acontecimentos surreais. Em um momento de tranquilidade, Jolie se encontrou sentada no camarim do histórico Teatro alla Scala, em Milão, vestida como a heroína trágica de "Anna Bolena", de Gaetano Donizetti.

"A parte mais louca nem foi estar no palco, porque, no palco, você meio que sai do seu corpo quando algo está além de você", diz Jolie. "Foi aquecer naquele camarim, sabendo que eu teria que descer e cantar naquele palco na frente das pessoas que trabalham na La Scala, acostumadas a ouvir os sons mais maravilhosos do mundo." 

Tudo isso — a preparação, as performances, a irrealidade — culminou na cena final do filme, que foi uma metáfora adequada para aquela mistura de habilidade e sentimento puro. No dia 16 de setembro de 1977, data da morte de Callas por ataque cardíaco, ela cantou uma última vez: uma poderosa interpretação de "Vissi d’arte", da ópera "Tosca", de Giacomo Puccini, que foi alta o suficiente para ser ouvida nas ruas de Paris. "É engraçado — bem, talvez não engraçado —, mas percebi que não conseguia cantar e chorar ao mesmo tempo", lembra Jolie. 

"O segredo para cantar ópera é relaxar a garganta e o corpo, depois forçar os músculos e deixar o som sair dessa forma", ela continua. "E quando você chora, todos esses mesmos músculos se contraem e se fecham."

Enquanto pressionava bolsas de água morna contra a garganta, Jolie percebeu que tanto o sentimento quanto o canto precisavam vir de um lugar mais profundo e menos cerebral: "Você sabe quando você chora e as lágrimas escorrem pelo rosto, mas você não está tensa?". O avanço veio quando ela entendeu que a luta era o ponto central — que, nessa fase da vida, Callas estava tentando igualar uma versão idealizada de si mesma. Então, Jolie percebeu que sua voz não era suficiente, e isso era exatamente o que a cena precisava. 

"Foi muito estranho", diz ela. "Estava além do meu nível de habilidade e era algo que eu realmente precisava alcançar, o que parecia certo para Maria, porque ela é quem ela é. Eu frequentemente estava na sombra dela e apenas tentava alcançá-la."

Jolie deixou "Maria" com um imenso senso de gratidão. "Estou muito consciente de quão afortunada sou", diz ela. "Sempre amei atuar; sempre abordei isso da mesma maneira. Mas agora sou ainda mais grata por ter a chance de viver como artista e trabalhar com outros profissionais da área. É um privilégio poder brincar com os outros e compartilhar emoções. Quando estava filmando 'Maria', eu tinha quase 50 anos e estava sentada com professores me ensinando uma habilidade que eu nunca pensei que aprenderia. Encontrar sua voz e cantar — que presente é esse, e como é bonito compartilhar isso com o público. Quando encontro alguém que se conectou com um filme que fiz, me sinto menos sozinha neste mundo."

A busca por criar conexões genuínas continua impulsionando Jolie para novos territórios criativos. No ano passado, ela recebeu seu primeiro Tony Award como produtora do vencedor de melhor musical, The Outsiders. Ela também retornou à cadeira de diretora após sete anos para filmar o drama de guerra de 2024 Without Blood, estrelado por Salma Hayek. Além disso, ela continuou seu trabalho humanitário, fazendo uma viagem ao nordeste da África em setembro passado para encontrar refugiados deslocados pela guerra civil em andamento no Sudão.

Jolie acredita que a arte — especialmente a arte global — é uma maneira incrível de aprendermos uns com os outros. O que significa ser humano? É a beleza do que fazemos. O pior é quando as coisas giram em torno de ser dividido, diferente, competitivo ou não se trata de compartilhar. Isso realmente arruína algo tão especial."

Quanto aos próximos passos diante das câmeras, ela está atualmente filmando Couture, de Alice Winocour, um drama ambientado no mundo da moda parisiense. E depois disso? "Maria" despertou nela o interesse por tentar coisas novas. Recentemente, ela disse ao Deadline que gostaria de tentar um papel em uma comédia autêntica, gênero ao qual ela se aproximou em projetos como "Malévola", mas nunca abraçou completamente.

"Há uma responsabilidade com o público", diz ela. "Há uma parte de mim como artista, é claro, que quer explorar todos os diferentes tipos de meio para contar histórias. Mas também estou muito consciente de onde me conecto e onde talvez alguém se destaque mais. No que diz respeito à comédia, não tenho certeza se seria capaz de entreter uma audiência e fazê-la rir, sendo o que eles precisam que eu seja. É sobre a troca — é menos sobre o que eu quero fazer e mais sobre onde um público sente que você é eficaz."

Esses são pontos perfeitamente válidos, mas eu proponho que ela provavelmente sentiu o mesmo sobre cantar antes de passar por sete meses de treinamento intensivo para se tornar uma das mais influentes artistas de ópera de todos os tempos. Jolie pensa um pouco sobre o assunto e então me diz: "Você sabe, eu nunca fiz 'Saturday Night Live'. Sempre tive curiosidade, mas nunca fui convidada."

Esse pivô imediato — aquela faísca instantânea diante da perspectiva de um novo desafio — revela mais sobre Jolie como artista do que qualquer coisa que ela pudesse colocar em palavras. É uma curiosidade e uma resistência a ser dita o que é possível, tão permanente quanto a tinta na sua pele.

"Bem", ela diz como se tivesse acabado de decidir algo, "desafio aceito."

Fonte: Backstage